Você provavelmente conhece alguém com diabetes ou hipertensão – talvez até você mesmo. De acordo com o Ministério da Saúde, as Doenças e Agravos Não Transmissíveis (DANT) são responsáveis por mais da metade do total de mortes no Brasil. Em 2019, 54,7% dos óbitos registrados no Brasil foram causados por doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) e 11,5% por agravos. No Brasil, foram registrados mais de 730 mil óbitos por DCNT em 2019. Destes, 308.511 (41,8%) ocorreram prematuramente.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define como doenças crônicas as doenças cardiovasculares, as neoplasias, as doenças respiratórias crônicas e a diabetes mellitus. A OMS também inclui nesse rol aquelas doenças que contribuem para o sofrimento dos indivíduos, das famílias e da sociedade, tais como as desordens mentais e neurológicas, as doenças bucais, ósseas e articulares, as desordens genéticas e as patologias oculares e auditivas.
De olho no potencial de atender tantas pessoas Victor Navarrete e seus dois sócios, José Gutiérrez e Sulivan Santiago, lançaram-se ao mercado de healthtecs no começo da pandemia. A startup deles, chamada Lincon, aproveitou a ascensão da telemedicina no período de isolamento social.
Victor vem de família empreendedora, neto de um imigrante espanhol fugitivo de guerra que se reergueu em terras brasileiras. Inspirado nessa figura ancestral, ele procura oportunidades de empreender desde a juventude.
“Fui empreendendo, errando, acertando. Cheguei a ser sócio de um marketplace de empregos, fui sócio de uma empresa de aluguel de carros, de motos… E numa dessas, fui contratado pela Ace para trabalhar no mercado de aceleração. Foi quando conheci o Sulivan e o José. O Sulivan trabalhou na IBM antes, então ele vem com expertise do mercado de tecnologia. E o José foi sócio de empresas na Espanha, startups de saúde, até com médicos do Real Madrid, e traz essa visão do mercado de saúde”, conta Victor.
“Estávamos no meio da pandemia, a telemedicina foi autorizada, começou a se estabelecer, e vimos que vinha para ficar. Então vendemos nossa participação na empresa em que trabalhávamos e ficamos três meses só fazendo validação, conversando com pessoas da saúde, de pequenos a grandes, de pacientes à indústria, para entender onde estavam as oportunidades.”
Os sócios decidiram focar no mercado de tratamento de doenças crônicas não-transmissíveis, dada a prevalência das DCNT no Brasil.
Se a forma convencional de tratar esses pacientes era por meio de consultas presenciais, muitas vezes negligenciadas pelos próprios pacientes ou difíceis de serem marcadas, então era hora de inovar. Outra sacada do trio foi ofercer a prevenção e a mudança de hábitos como o melhor caminho para a jornada dos pacientes.
“Começamos a trazer gente boa para nos ajudar. Trouxemos o dr. Maurício Leitão, pesquisador em telemedicina na universidade de Massachusetts, Dave Engberg que é o CTO da Livongo, o Eric Hauschild, CEO da empresa que leva o nome dele, e ex-CEO da Abbott, e agora trouxemos a Ana Elisa Siqueira – sócia do Grupo Santa Celina, adquirido pela Dasa. Então, levantamos capital e fomos atrás das certificações científicas necessárias na área da saúde para comercializar as soluções”, diz.
De cara, o grupo conseguiu um investimento de R$ 1 milhão no chamado “pré-seed”, quando o projeto ainda é, como o termo sugere, uma semente. A empresa foi, então, colocada de pé com protocolos validados por equipes de cientistas em vários testes.
A Lincon foi fundada com base em seis pilares: alimentação, atividades físicas, qualidade do sono, medicação, saúde emocional e capacitação. A premissa é muito simples: dar suporte online para o paciente diabético ou pré-diabetico e hipertenso ou pré-hipertenso, para que ele não tenha que esperar pela consulta presencial.
A startup também atua no controle de obesidade e colesterol alto e com saúde mental.
“Toda nossa metodologia e pirâmide de atendimento está ancorada em como engajar o paciente. Nosso foco e diferencial é mantê-lo engajado. Porque quanto mais eu engajo, melhor desfecho ele terá”, descreve Victor.
Esse engajamento não é pontual, mas contínuo. Uma vez cadastrado, o paciente recebe mensagens constantes de uma equipe multidisciplinar, composta por médicos, psicólogos, nutricionistas, educadores físicos e coaches de saúde.
O app da Lincon funciona como uma plataforma que concentra os dados e parâmetros do paciente, facilitando o acompanhamento e o controle de comorbidades crônicas.
“Hoje, temos quatro públicos-alvo: o paciente, que é quem usa a solução e se beneficia disso; o empregador, que busca reduzir o absenteísmo e os custos com saúde; o plano de saúde que tem custos elevados com pacientes crônicos; por último, o mercado farmacêutico, que busca fidelizar o paciente em um único medicamento, tanto para que ele não abandone o tratamento como para que ele faça efeito”, conta Victor.
O modelo de negócios, portanto, pode atender diretamente a pessoa física, que se cadastra na plataforma ou pode ser contratado por empresas que buscam oferecê-lo como benefício corporativo.
“Falamos com cada usuário pelo menos uma vez por dia, em média. O paciente pode ter uma dificuldade em sua rotina e querer entrar em contato com o médico. Ele pode estar num almoço e querer saber se pode comer determinada comida. Então ele tira uma foto e manda para o nosso nutricionista que o orienta. Esse é um exemplo de como oferecemos terapia digital personalizada, que se adapta à medida que conhecemos mais cada paciente”, conclui.
Os próximos passos da Lincon, agora que a saúde mental foi incluída no rol de serviços, é entender cada vez mais sobre os dados referentes a esse campo de atuação, mantendo o usuário engajado e melhorando a experiência tecnológica do aplicativo.