• Saúde mental também é coisa de pele: conheça a psicodermatologia

    Lucia Rebello, médica dermatologista e membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia.
    Lucia Rebello, médica dermatologista e membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia.
    Tiago Jokura | 9 jul 2024

    Psicodermatoses são lesões cutâneas causadas ou influenciadas por fatores emocionais.

    Podemos exemplificar com a acne: os fatores emocionais frequentemente a agravam e, por outro lado, as lesões de acne, ou cicatrizes formadas por ela, podem desencadear ou exacerbar quadros de depressão, ansiedade, baixa autoestima e neuroses.

    Desde o início do século 20, observa-se que a mente, o estresse e as emoções podem influenciar diretamente a saúde da pele.

    A partir de 1984, com a publicação de Emiliano Panconesi “Psychosomatic Dermatology: Stress and Skin Diseases”, autores passaram a difundir a interação mente-pele, que hoje recebe o nome de psicodermatologia.

    A pele e o sistema nervoso têm a mesma origem embrionária e existe uma influência direta de um sobre o outro. 

    A pele recebe interferência direta da mente quando alguém fica com o rosto avermelhado ao passar por uma situação embaraçosa; quando se está nervoso e aumenta a sudorese; quando se está assustado e os pelos se eriçam ou quando a pessoa fica pálida, dentre outras ocasiões.

    Nos últimos tempos, a psicodermatologia tem ganhado relevância devido ao crescente reconhecimento da importância da saúde mental na medicina e de uma abordagem cada vez mais integrativa do paciente, além da crescente conscientização sobre transtornos mentais, como depressão e ansiedade. 

    Recentemente, durante a pandemia de Covid-19, observamos o aumento significativo de psicodermatoses.

    Isso se deveu a diversas condições de saúde mental exacerbadas pelo isolamento social, estresse e pelas incertezas vivenciadas nesse período.

    O estresse pode ser definido como o conjunto de respostas neuromoduladas que ocorre sempre que há uma ameaça, real ou imaginária, e que libera substâncias como cortisol e catecolaminas. Cronicamente, esse estímulo leva a alterações fisiológicas que favorecem o aparecimento de doenças.

    As psicodermatoses são as alterações cutâneas que podem ser causadas por problemas psiquiátricos – como a dermatite factícia, por exemplo, em que o próprio paciente provoca lesões em sua pele e nega tê-las provocado. Além disso, a recíproca também acontece, isto é, quase todas as doenças da pele são capazes, em maior ou menor grau, de afetar emocionalmente os pacientes. 

    Alguns outros exemplos de psicodermatoses são as escoriações neuróticas – lesões compulsivas autoproduzidas – causadas por neuroses, ansiedade ou depressão – localizadas nas áreas onde há alcance das unhas. 

    Também existem as dermatofobias, como o delírio de parasitose, em que os pacientes acreditam ter parasitas andando pela sua pele, além de outros quadros que podem evoluir para psicoses alucinatórias.

    As compulsões são causadas por um impulso irresistível e repetitivo e podem ser observadas nos casos de lavagem excessiva das mãos; onicofagia (roer as unhas); acne escoriada (quando o que marca a pele são as lesões provocadas pela unha do paciente e não a acne em si – que, muitas vezes, é leve nesses casos – e tricotilomania (a pessoa arranca os próprios fios de cabelo, por vezes causando grandes áreas de alopecia).

    Outras dermatoses que podem ser desencadeadas ou influenciadas por fatores emocionais: psoríase (quando as células da pele se acumulam e formam escamas e manchas secas que causam coceira); alopécia areata (doença inflamatória que provoca a queda de cabelo); vitiligo (perda de coloração da pele); dermatite atópica (inflamação da pele, levando ao aparecimento de lesões e coceira); hiperidrose (suor excessivo); herpes simples e líquen simples crônico (coça sempre no mesmo local e isso “engrossa” a pele, piorando a coceira).

    Também não podemos deixar de falar sobre a dismorfofobia, em que há preocupação excessiva com defeitos mínimos (ex: poro aberto, nariz, lábios) e isso pode levar a uma falta de limites em cirurgias e procedimentos estéticos – o paciente acha que nunca está bom, pois não se vê como realmente é – e isso pode levar a exageros ou até deformidades.

    A medicina tem reconhecido que as pessoas devem ser avaliadas de forma integral. Já está mais do que comprovado como a mente, a pele e diversos outros sistemas estão interligados. Na psicodermatologia, portanto, é fundamental o acompanhamento multidisciplinar do paciente com dermatologistas, psiquiatras e psicólogos.

    *Dra. Lucia Rebello é médica dermatologista e membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia.

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