Quando Rogério Pires saiu de uma empresa de internet e começou a trabalhar em uma do setor de saúde, há 12 anos, ficou impressionado… com o atraso tecnológico que existia em relação ao local de onde ele vinha.
“Havia um delay de uns dez anos de evolução tecnológica”, ele diz, ressaltando que, claro, há justificativas para a regulação do setor, como o fato de lidar com vidas humanas.
Mas a saúde foi evoluindo. E a pandemia foi, definitivamente, o ponto de virada. “Andamos cinco anos em um”, conta o head de Healthcare da Totvs, gigante nacional de tecnologia, que oferece soluções para empresas de diversos portes e segmentos.
Hoje, Rogério considera que a tecnologia está consolidada na saúde, já em pé de igualdade com outros setores.
Para apoiar instituições de saúde a acelerarem seus processos de transformação digital, e tornarem-se mais produtivas, a Totvs reformulou em fevereiro deste ano seu portfólio de produtos e serviços de saúde.
A empresa, que tem de 650 clientes no segmento, mais 6 milhões de vidas administradas pela vertical de Planos de Saúde e uma em cada 4 operadoras de planos de saúde como clientes, é a única a usar nuvem própria em soluções de ERP por assinatura para a saúde.
Ela oferece, entre outras, funcionalidades como telemedicina integrada ao prontuário eletrônico e sistemas de auditoria com inteligência artificial.
Para muitos de seus produtos, a Totvs conta com parcerias com healthtechs – cujo boom Rogério acredita ser a grande tendência para um futuro que já está por aqui.
É sobre essas e outras coisas, como sua paixão pelas competições de mountain bike, que ele conta nesta entrevista.
Como vinha caminhando o segmento de healthcare na Totvs e o que aconteceu com ele com a pandemia?
A Totvs é uma empresa multissegmentada, mas, ao mesmo tempo, por ser muito grande, costumo dizer que cada segmento é uma empresa. A Totvs já vinha em uma pegada muito forte de evolução tecnológica, e com a saúde não poderia ser diferente. Os clientes demandavam novos frameworks de desenvolvimento, soluções web, estávamos em um processo muito forte de “cloudficação” das soluções, com planejamento estratégico. E veio a pandemia, e a pandemia mudou tudo. Historicamente, o segmento de saúde é muito físico, presencial.
O médico sempre quis atender o paciente presencialmente. O paciente queria ir pessoalmente pegar o exame.
Do dia para a noite, isso não era mais possível. E então começou uma busca ferrenha de nossos clientes por um processo de digitalização para que eles não parassem. A gente, da tecnologia, teve que tirar muito projeto da gaveta, acelerar a toque de caixa. Por exemplo, a gente teve que desenvolver uma solução de telemedicina integrada ao nosso prontuário em semanas – coisa que, no passado, levaria meses. Os clientes pediam solução para a jornada digital do paciente, agendamento digital, check-in digital, tudo para ontem.
Algumas coisas a gente desenvolveu; para outras, buscamos parceiros para integrar a nossa solução.
Andamos cinco anos em um. E houve um ganho para o segmento como um todo. Os clientes viram que aquilo era bacana, que gerava economia, produtividade, então resolveram continuar na toada. E isso tornou o segmento muito mais tecnológico. Nosso foco é gerar produtividade para o cliente, ser um parceiro nessa questão como provedor de solução. E isso casou como uma luva para o nosso propósito de evolução de produto.
Em termos de produto, vocês reformularam o portfólio de saúde. Quais são os destaques?
Hoje, a Totvs é uma empresa que tem o maior portfólio em ofertas de saúde: temos soluções para operadoras de saúde, autogestões, cooperativas médicas, e para hospitais de todos os portes e clínicas médicas. A gente trabalha com soluções complementares, por exemplo, temos app para operadora. Paralelo a isso, a gente tem o cloud próprio para nossas soluções, somos a única empresa do segmento saúde que tem isso.
Isso é uma coisa muito séria, obviamente tem compliance com as normas regulatórias, LGPD, preservando a segurança de informação.
Temos uma plataforma hoje de inteligência artificial, a Carol, que é feita por nosso time de desenvolvedores no Totvs Labs, na Carolina do Norte. E a gente também tem uma plataforma de colaboração, de desenvolvimento, a Fluig, que tem muita aceitação no mercado, para soluções específicas para clientes, fluxos. Temos ainda uma plataforma de analytics, em que as soluções são entregues com dashboards. Somos líderes de mercado no segmento de operadores de saúde, cooperativas médicas, e de um tempo para cá a gente vem desenvolvendo muito a parte de prestadores, que são hospitais, clínicas.
Em 2020, transferimos nosso centro de desenvolvimento para Belo Horizonte e hoje temos aqui por volta de 80 desenvolvedores focados nessa solução.
Temos evoluído bastante o produto. Recentemente, lançamos um novo prontuário eletrônico, totalmente web, compatível com dispositivos mobile, e migramos toda a solução para uma nova tecnologia. E a gente trabalha com soluções em inteligência artificial também. A Totvs quer ser parceira do cliente na melhoria da sua produtividade, isso que direciona o desenvolvimento de nossas soluções.
Criamos uma solução para suportar as operadoras de saúde nas auditorias médicas baseada em inteligência artificial.
Todo procedimento passa por um processo de auditoria. O cliente quer fazer um um raio X, por exemplo. Utilizando algoritmos, o sistema avalia se aquele procedimento pode ser aprovado. E a máquina vai aprendendo, para auxiliar as operadoras a ter uma maior agilidade nesse processo de auditoria. E também, obviamente, evitando fraudes. Se o auditor é um enfermeiro ou um médico, ele tem que ficar clicando os procedimentos um a um. Com o algoritmo de IA, o ganho de produtividade é de mais de 30%. E a gente vem desenvolvendo outras coisas aí no que tange a otimização de custos médicos.
Pode dar um exemplo?
Temos um cliente para o qual queremos dar uma previsibilidade do custo de uma operadora. Imagine que um paciente vai fazer um exame de colonoscopia no hospital. Isso pode ser uma bola de neve, porque esse paciente pode ter, por exemplo, um choque anafilático com uma anestesia e ter que ir para o CTI. O custo, portanto, é imprevisível. Estamos agora criando mecanismos, com inteligência artificial, para a operadora negociar com seus prestadores o preço médio de cada tipo de exame, que vai ser quanto ela vai pagar para ele. Assim, queremos mitigar um pouco a inflação médica.
Qual é a estrutura da Totvs dedicada à saúde?
Só no segmento saúde temos por volta de 300 pessoas. Hoje, a gente está distribuído em três centros de desenvolvimento. Temos um em Belo Horizonte, que cuida dos produtos de hospitais e clínicas; um em Caxias do Sul, que conta com cerca de 120 pessoas que cuidam da nossa solução para cooperativas médicas; e um centro de desenvolvimento em São Paulo, focada em operadoras de saúde.
E qual o investimento no segmento?
Investimos, todo ano, por volta de 80 mil horas e R$ 30 milhões em inovação só para saúde.
Você escreveu um artigo, no fim de 2020, apontando algumas tendências para 2021, como a ascensão das healthtechs, a telemedicina e a presença da inteligência artificial em tantos usos que nem perceberíamos. E agora, quase no fim de 2021, quais são as tendências que você vê para a saúde?
A gente vive um momento ímpar, como nunca viveu, no setor. A pandemia foi transformacional em relação à tecnologia. Comecei a trabalhar em saúde há 12 anos, quando saí do UOL. Para mim foi um choque, a gente vivia um delay aí de uns dez anos de evolução tecnológica. No UOL, a gente já falava em soluções em cloud, em portais, tecnologia. Internet está um passo a frente de tudo em questão tecnológica. Quando fui para a saúde, não tinha nada disso. Claro, com as devidas justificativas: eram sistemas que lidam com vidas. Só que isso está mudando demais. Hoje, está quase de igual para igual.
Se eu puder prever o que que vem pela frente, eu diria que é o boom das healthtechs, que vêm atraindo executivos do mercado.
Veja quanto os fundos de investimento estão colocando em healthtechs recentemente. Um amigo pessoal que era executivo da Unimed de BH acaba de sair para ir para uma startup. Ele é um médico da família e foi organizar uma startup de saúde que recebeu um aporte multimilionário. É a transformação do mundo, da mesma forma que há cinco anos começaram a sair executivos dos grandes bancos para ir para as fintechs, agora é o momento da saúde. A gente das grandes indústrias não consegue atender a demanda dos clientes por inovação porque muitas vezes a nossa roda não gira com a velocidade que uma healthtech tem. Elas não têm o legado que temos, mas elas podem agir muito na tentativa e erro.
Vocês fazem parcerias com algumas healthtechs. Como elas funcionam?
Sim, a Memed, por exemplo, é uma parceria nossa. Sou fã do produto deles. A CM Tecnologia também. Procuramos estar no ecossistema deles e capitanear o que a gente pode. A Totvs tem um área para essas parcerias, um ecossistema que chama iDEXO. Ele é o nosso braço para estar antenado no mercado. Quando alguma startup me procura ou quando eu me interesso por alguma, procuro o Vitor [Andrade], diretor do iDEXO. Eles então fazem a intermediação e vemos se tem um fit tecnológico, um feat de soluções com a gente. A partir daí, acontece um piloto, que pode evoluir para uma parceria.
E então essa startup é colocada em nossa força de vendas, para entrar como parceira ou como integrada à nossa solução.
Em nosso prontuário a Memed está incluída e, em nossa jornada do paciente, está a solução da CM Tecnologia. Temos ainda outra startup, que é a Anestech, integrada ao nosso prontuário. A gente não quer fazer tudo. Nosso crescimento também se embasa em parcerias. Esse é o DNA da Totvs. Ela entende que a parceria é uma alavanca de crescimento, é muito importante para a gente. Muitas vezes a gente adquire também a startup, se ela for muito interessante para a gente. A gente não acredita que sozinho vai conseguir chegar onde a gente quer.
Você é um atleta amador de mountain bike, é isso?
Sou. Eu pedalo já há uns 15 anos em uma pegada competitiva. Claro, com altos e baixos, porque tem épocas na vida que não dá. Felizmente consegui voltar para BH há dois anos, porque o pessoal costuma dizer que aqui é o Colorado do mountain bike no Brasil. Tenho uma rotina de treinos e já participei de várias provas ao redor do mundo.
Gosto muito de provas de ultramaratonas, que são provas que duram sete, oito dias, e nas quais pedalamos umas seis horas por dia – e só pirambeira.
Já participei de provas como a Cape Epic, na África do Sul, várias vezes aqui da Brasil Ride, que era na Chapada Diamantina, e várias outras. Também já fiz provas de road também, como uma de Nova York. Gosto muito de competição e sou um atleta amador bem disciplinado. É o que dá endorfina, meu contrapeso para o estresse do dia a dia.
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