Somos uma nação de insones. Não é exagero dizer isso: segundo dados da Associação Brasileira do Sono, em 2019 éramos 73 milhões de pessoas com insônia no país – e 45% dos brasileiros queixavam-se de dormir mal.
Para pessoas mais novas, a situação é ainda mais dramática: de acordo com um estudo feito já em 2020, com todo o cenário da pandemia, 70% de 33.688 jovens entrevistados (com idades entre 15 e 29 anos) relataram uma piora no estado emocional, com 55% destacando efeitos negativos na qualidade do sono.
Seis anos antes de o Sars-Cov-2 virar o mundo de cabeça para baixo e tirar o sono de bilhões de seres humanos, Lucas Baraças e Guilherme Hashioka eram colegas no curso de engenharia da computação na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, cujas credenciais falam por si só.
O primeiro emprego que compartilharam foi em uma empresa que criava tecnologia para grandes empresas, como Extra e Boticário, e também atuava na área da saúde. “A gente trabalhava para clientes como o Hospital Albert Einstein, Droga Raia e Fleury”, afirma Lucas.
“Certa vez, fizemos uma consultoria para uma farmacêutica que vendia medicamentos para dormir. Como engenheiros, não entendíamos nada de insônia, nem sabíamos que isso era um problema”, confidencia.
“O projeto foi muito legal, porque a gente acabou conhecendo esse mundo e, ali, desenhamos o que seria o embrião do Vigilantes do Sono”, conta. A Vigilantes, no caso, é a startup fundada por Lucas, Guilherme e Laura Castro.
Anos antes da fundação, no entanto, a dupla de engenheiros tentou vender a ideia para a farmacêutica na qual trabalhavam. “Os resultados dos projetos foram muito interessantes, mas a farmacêutica decidiu não continuar investindo nele em função de outras prioridades”, conta o empreendedor, que percebeu que, naquele momento e naquele lugar, o projeto não avançaria.
UMA IDEIA QUE O TEMPO NÃO APAGOU
Com a negativa, Lucas foi para Barcelona estudar e Guilherme seguiu com outros projetos. No fim de 2018, os dois, trabalhando na mesma empresa de tecnologia, voltaram a pensar no negócio.
“Eu sabia que a minha vida poderia ser diferente e que eu poderia fazer coisas mais interessantes do que ajudar a empresa que eu trabalhava a vender perfumes”, ri Lucas.
Dito e feito: no segundo semestre de 2019, os engenheiros entraram em contato com duas médicas que trabalhavam na mesma empresa, referências de insônia no Brasil. Elas que indicaram a pessoa que poderia ajudá-los: Laura Castro.
Só tinha um problema. Laura estava com uma viagem marcada para Boston dois dias depois da conversa em questão. Ela partiria para um doutorado sanduíche (quando o acadêmico realiza uma parte do curso em um local e a outra metade em uma localidade diferente) em Harvard.
Os dois correram atrás dela prontamente. “Eu já tinha entregado meu apartamento, estava morando em um flat ao lado da Unifesp e eles me encontraram em uma padaria na região”, lembra Laura.
“No início achei uma viagem e tive dificuldade em acreditar que o projeto poderia vingar, mas sempre tive interesse no campo da tecnologia, e pedi para conversarmos melhor futuramente”, conta ela.
“Dois meses depois, fui procurada por uma startup para trabalhar como psicóloga do sono – e então percebi que não poderia perder essa oportunidade”, afirma.
Formada em psicologia pela Universidade Estadual de Londrina e já tendo atuado como pesquisadora, estatística e gerente administrativa de operações no Instituto do Sono, Laura era o fit perfeito para trabalhar ao lado de Lucas e Guilherme.
Estava formada a tríade que daria vida à startup Vigilantes do Sono. Lucas tomaria a posição de CEO; Guilherme, de CTO; Laura, de sócia e diretora de psicologia.
Mas o que, afinal, é o Vigilantes do Sono?
O QUE É O VIGILANTES DO SONO
Startup que tem como objetivo melhorar o sono das pessoas, o Vigilantes do Sono criou um programa digital que foca nos hábitos de seus usuários para trazer melhorias reais ao momento de dormir alheio.
“Ele é muito parecido com o programa de emagrecimento, no qual você tem que começar a praticar atividade física, fazer dieta… Só que são hábitos relacionados ao sono”, explica Lucas.
Utilizando Terapia Cognitivo-Comportamental para insônia, tudo é feito pela pessoa – mas um robô foi desenvolvido para conduzir o usuário nessa jornada, com interações diárias.
O Vigilantes do Sono atua em quatro frentes:
Para o Vigilantes nascer, porém, foi necessário ter um suporte financeiro da consultoria na qual eles trabalhavam durante sua fundação, a Taqtile.
“Foram dois acordos: um de R$ 400 mil, no fim de 2019, e um de R$ 700 mil válido até o final de 2021”, explica Guilherme. A equipe total da startup é de sete pessoas.
OS NÚMEROS E O FUTURO DO VIGILANTES DO SONO
Até o momento, o Vigilantes do Sono já teve 25 mil usuários – a maioria provenientes de um período gratuito de testes. O intuito era provar que o programa funcionava – e foi graças a isso que Laura conseguiu constatar a alta taxa de sucesso do programa.
Segundo os empreendedores, o Vigilantes reduz a latência do sono (o tempo que a pessoa demora para adormecer) em média de 30 minutos. O programa também consegue diminuir o tempo que a pessoa demora para pegar no sono quando desperta durante a noite – e aumenta o tempo de sono de uma pessoa em 1h19 por noite.
No segundo semestre de 2020, apenas com assinaturas do programa, o Vigilantes do Sono teve um faturamento de R$ 8,5 mil, e passou a olhar mais para o mundo corporativo. Dali em diante, formou uma série de parcerias e pilotos com grandes empresas como Fleury, Azul e Porto Seguro.
“A gente está em um processo de aceleração da Porto. Acabamos de fechar com uma farmacêutica e com várias empresas que vão oferecer o programa para seus colaboradores”, conta Lucas, animado.
“Aumentamos nosso faturamento em 10 vezes do último semestre para este.”
A GymPass também está em conversas com o Vigilantes, além de seguradoras de saúde – e a startup poderá ser oferecida pelo Psicologia Viva, uma empresa que oferece terapia online.
Uma outra grande empresa também fechou uma parceria com o Vigilantes do Sono: o Boticário. No fim do dia, Lucas, Guilherme (e agora Laura) continuam ajudando a empresa a vender produtos – mas agora fazendo com que seus funcionários possam dormir melhor.
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