Você já ouviu falar em Novembro Azul? Assim como o Outubro Rosa, trata-se de uma campanha de conscientização que se estende por todo mês. Só que, dessa vez, o foco é neles, e não nelas. O objetivo dessa campanha é falar sobre o câncer de próstata, seus riscos e tratamentos e, claro, lembrar a todos de fazerem seus exames de rotina, a melhor forma de rastrear um câncer ainda no início.
Bruno Mello Santos, professor de urologia na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e urologista na rede Mater Dei, alerta:
“O câncer de próstata é o tipo mais comum no homem no Ocidente, e é a segunda causa de morte de câncer entre homens, perde só para o câncer de pulmão.”
De acordo com o INCA, estimam-se 65.840 casos novos de câncer de próstata no Brasil para cada ano do triênio 2020-2022. Esse valor corresponde a um risco estimado de 62,95 casos novos a cada 100 mil homens. Ele ocupa a primeira posição no país em todas as regiões brasileiras, com um risco estimado de 72,35/100 mil no Nordeste; 65,29/100 mil no Centro-Oeste; 63,94/100 mil no Sudeste; 62,00/100 mil no Sul; e de 29,39/100 mil no Norte.
Como já abordamos aqui em FUTURE HEALTH, há vários tratamentos possíveis para esse tipo de tumor, mas antes, é preciso entender sua intensidade e se ele ainda é local ou já se espalhou.
“Atualmente, quase metade dos tumores de próstata diagnosticados são classificados como indolentes, ou seja, que tem o desenvolvimento lento e permite ao paciente viver com ele sem problemas. Quando é esse o caso, nós somente acompanhamos os pacientes com exames anuais, um tratamento chamado vigilância ativa”, explica Bruno, que é especializado em cirurgia robótica urológica.
Um outro tratamento possível é a prostatectomia, que nada mais é do que a cirurgia de remoção da próstata – a glândula é presente somente no homem, abaixo do abdome, onde a testosterona é produzida.
“Quando falamos de cirurgia do câncer de próstata, ela é sempre total, não existe parcial. Existe uma raspagem, uma cirurgia endoscópica, que seria uma retirada parcial só do miolo da próstata, mas essa é uma cirurgia indicada para crescimento benigno, não para o câncer de próstata. Caso contrário, é sempre prostatectomia radical”, pontua.
Assim como há vários caminhos de tratamento, há vários caminhos cirúrgicos. A cirurgia aberta é a mais antiga e utiliza cortes e incisões; a laparoscopia, por sua vez, oferece uma incidência menor de cortes, mais direcionados e menores, além de câmeras auxiliando o médico.
“Apesar de ser uma técnica menos invasiva, a laparoscopia é difícil de aprender, complexa, ainda mais na prostatectomia em que trabalhamos em uma área estreita, de difícil acesso. Até há pouco tempo ela era pouco usada no mundo porque demandava uma alta curva de aprendizado”, esclarece o urologista.
Então, nos Estados Unidos dos anos 2000, surgiu uma técnica igualmente menos invasiva, que proporciona ao paciente uma recuperação mais rápida, com menos tempo de internação e mais fácil de aprender: a cirurgia robótica. Ela ainda oferecia alguns recursos inéditos ao médico, como pinças móveis e visualização em 3D. Nos EUA, aliás, a técnica já é a mais usada para prostatectomia – em 90% dos casos, segundo Bruno.
De lá para cá, ela chegou ao Brasil e foi aperfeiçoada. O robô, como foi idealizado nos anos 2000, por exemplo, só tinha 3 braços. Depois veio um robô mais novo, com 4 braços. As pinças também foram melhorando e se tornando mais precisas, assim como a visão e a qualidade da imagem.
Outro avanço foi na curva de aprendizado dos cirurgiões. “Já utilizamos a técnica há muitos anos aqui no Brasil. Em Belo Horizonte, por exemplo, desde 2016. Então, há uma quantidade maior de cirurgiões preparados para lidar com essa tecnologia”, detalha Bruno.
Em termos de perspectivas, os médicos da área estão esperançosos em ter mais empresas produzindo esse robô cirurgião, chamado Da Vinci. Hoje em dia, somente uma empresa, a Intuitive, produz a plataforma robótica. “Talvez com uma concorrência entre outros fabricantes, os custos sejam reduzidos, o que democratizaria a tecnologia para mais pacientes”, diz.
Quando se fala em cirurgia de câncer de próstata, há três objetivos principais que os especialistas envolvidos buscam atingir. O primeiro, é claro, é a cura do câncer. O segundo é a manutenção da continência, ou seja, evitar que o paciente deixe a urina escapar involuntariamente. O último, mas não menos importante, é evitar que o indivíduo perca a função sexual. “Esse é o tripé considerado crucial, mas é claro que também consideramos tempo de internação e dor como importantes. Mas em termos de hierarquia e objetivo, procuramos atingir esses três objetivos”, descreve Bruno.
Isto posto, é difícil – praticamente impossível – cravar que técnica é a melhor entre a cirurgia aberta, a laparoscópica e a robótica. Não há estudos na área que cravem essa resposta porque ela é subjetiva e envolve mais do que a técnica em si, mas também a capacidade de cada cirurgião e o caso específico da doença de cada paciente.
“Em termos de cura oncológica, conseguimos a mesma taxa de cura com os três métodos. A continência urinária consegue se preservar com mais probabilidade na robótica, e essa recuperação é mais precoce. Quanto à manutenção da ereção, é difícil comparar as técnicas, porque aí você está comparando os cirurgiões também, a destreza daquele profissional”, pondera.
O caso individual do paciente também é determinante. Fatores como obesidade, por exemplo, podem indicar uma intervenção robótica, que acessa a glândula com mais facilidade do que por vias abertas. Portanto, o médico pensa no melhor caminho levando em consideração sua conduta de preferência e o que será mais benéfico para o paciente.
Para além das cirurgias, há outros avanços no tema do câncer de próstata. Em exames de imagem, o Pet Scan, também conhecido como Pet-CT, é o principal deles. Muito usado em oncologia, é como se ele fundisse a imagem de uma tomografia com uma cintilografia, trazendo para análise clínica a imagem anatômica e metabólica funcional ao mesmo tempo.
“O PET é solicitado quando o paciente tem alto risco de metástase, a fim de identificar se esse tumor se espalhou, ou quando o tratamento falha e o paciente volta a ter uma produção de PSLA, que é o marcador de tumor, no pós-operatório. Com a tecnologia, localizamos de onde está vindo essa produção”, explica Bruno.
No campo do tratamento sistêmico, em casos que já produziram metástase, há medicações novas e em desenvolvimento. No caso da próstata, a hormonioterapia vem ganhando mais espaço com as manipulações hormonais, já que se trata de um câncer alimentado pela testosterona.
“Reduzir a testosterona é um tratamento sistêmico. É diferente de outros tumores em que se usa a quimioterapia já de cara. Então essas possibilidades de bloqueios hormonais vieram para ser a hormonioterapia complementar. Porque, às vezes, cortar o hormônio e fazer uma castração química de cara falha, e o médico ficava sem ter o que oferecer. Hoje, temos outros medicamentos que vão sendo sucessivamente empregados”, conta Bruno.
Essa modalidade abre caminhos para um nova possibilidade, que é tornar o paciente com doença metastática em portador daquela doença, mas assintomático. É como se ela tivesse se tornado crônica, permitindo que a pessoa viva bem, com qualidade de vida boa, apesar de o câncer ter se espalhado.
Por fim, a radioterapia também evoluiu, sobretudo na forma de se irradiar. “Antigamente, a radiação era mais imprecisa, então existiam queimaduras na bexiga, no reto, que são próximas da próstata. Hoje o radioterapeuta conta com tecnologia e equipamentos melhores para colocar a radiação só no tecido alvo, sem causar tanto dano para órgãos vizinhos, como ocorria antigamente.”
Para Bruno, campanhas como a do Novembro Azul são importantes para trazer consciência sobre os exames de rotina. Principalmente porque os homens não têm a cultura de se cuidar e procurarem médicos de forma preventiva.
“É uma oportunidade não só de analisar a saúde prostática, mas de ver a saúde urológica como um todo e, mais ainda, a saúde geral.”
Nesse tipo de visita médica, o paciente pode pensar em melhoria de estilo de vida, avaliar fatores de risco para doenças cardiovasculares, checar se a vacinação está em dia, dentre outros rastreamentos. É uma oportunidade de avaliar a saúde como um todo”, conclui.