Diagnosticar superbactérias no organismo pode custar caro. Aos hospitais, o valor é financeiro – os testes são dispendiosos e nem todas as unidades de saúde conseguem colocá-lo à disposição. Ao paciente, o preço pode ser a vida – quanto antes sair o diagnóstico, maiores as chances de sucesso no tratamento.
E não são raras as mortes em decorrência dessas infecções: segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 700 mil mortes ocorrem por ano, no mundo todo. E a situação tende a piorar. De acordo com um estudo de 2015, que se tornou referência, as mortes anuais devem chegar a 10 milhões até 2050.
Só na pandemia, o número de casos de infecção por superbactérias triplicou. E isso tem motivo: esses organismos oportunistas, resistentes à maioria dos antibióticos, se aproveitam de pacientes debilitados, como explica Marina Farrel Côrtes, pesquisadora do Instituto de Medicina Tropical (IMT) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP):
“Muitos pacientes precisaram ser intubados. E o tubo é um caminho direto para o pulmão. Se tem uma bactéria ali, ela entra direto, e pode fazer um estrago.”
“Em uma pessoa saudável, num estado normal, a superbactéria não ia conseguir chegar e se instalar. Mas ela pega essa carona, digamos assim, com a intubação ou após uma cirurgia”, completa Marina.
Cientes do alto custo dos exames – e da indisponibilidade em vários hospitais –, pesquisadores da (FMUSP) foram atrás de soluções. E encontraram uma possibilidade de reduzir em até duas vezes o preço, além de diminuir o tempo de resposta do teste.
“É difícil cravar quão mais barato ficaria. Mas, por exemplo, seria como fazer um teste rápido de Covid-19 por R$ 40 em vez de um PCR de R$ 200”, conta Marina.
Existem algumas formas de identificar a presença de superbactérias: por meio de exame PCR, como citado acima, e popularizado na pandemia de Covid-19 ou pela detecção de anticorpos no paciente, por exemplo. Mas os custos nem sempre cabem no orçamento dos hospitais.
Marina e sua equipe se atentaram ao potencial de fitas de DNA e RNA mais comumente estudados na área oncológica: os aptâmeros. Esses pedaços de material genético se encaixam em alvos específicos com quem têm mais afinidade. E isso pode indicar a presença de uma superbactéria.
Funciona como um exame de anticorpos. O médico coleta uma amostra de sangue ou material genético e coloca em contato com aptâmeros. Se um deles for conhecido por atacar uma determinada bactéria, bingo: o paciente provavelmente está contaminado por ela.
Com a análise de trilhões de sequências aleatórias de células inteiras, os pesquisadores encontraram um aptâmero viciado na Acinetobacter baumannii, um dos principais agentes causadores de infecções hospitalares. Ela pode se infiltrar no sistema pulmonar ou urinário, ou na corrente sanguínea – e causar estragos graves.
No teste, quando a coleta entra em contato com os reagentes, existe uma sinalização positiva ou negativa, exatamente como acontece com testes rápidos de Covid-19.
“Você coloca o teste, contendo esse aptâmero e uma molécula sinalizadora para detectar aquela ligação. Se brilhar, ligar ou fluorescer, ou seja, se detectar aquela ligação, é porque a bactéria está presente”, afirma Marina.
A novidade ainda pode servir como base para tratamentos na luta contra as infecções geradas por esses organismos.
Mas a técnica ainda precisa ser aperfeiçoada. Para entrar de vez nos laboratórios e hospitais, os aptâmeros precisam passar por baterias de estudos e testes.
“É muito mais barato identificar aptâmeros do que anticorpos. Muito mesmo: dez vezes mais barato. Mas é uma tecnologia nova, não sabemos se sairia logo de cara com um preço tão competitivo”, pondera Marina.
Ela explica que, como os anticorpos são usados há muito tempo na indústria de testes, as empresas estão mais preparadas para fabricá-los, ao contrário dos aptâmeros.
“Não é como se o uso de aptâmeros fosse algo revolucionário, como a cura do câncer. Trata-se, no entanto, de mais uma opção, uma alternativa para lugares que não podem usar outros testes mais caros”, conclui.