No início de outubro, depois de um ano de investimentos em infraestrutura, elaboração dos projetos e contratação de profissionais, começou a operar em Guarulhos, na Grande São Paulo, o InSPIRe Lab.
Sigla para In Silico Prediction, Information & Research Lab, o laboratório do Aché é voltado exclusivamente para análise de dados em larga escala e inteligência artificial, e está instalado no complexo industrial da companhia.
“Pioneiro no setor, o Lab pretende usar big data e IA para obter insights sobre usos terapêuticos de produtos naturais, planejar novas moléculas, predizer suas propriedades biofarmacêuticas e auxiliar o processo de aplicação de tecnologias farmacêuticas inovadoras a moléculas naturais e sintéticas”, afirma Cristiano Guimarães, diretor de Inovação Radical do Aché.
Para isso, o Lab usa os métodos in silico, que, aliás, batizam o local: a experimentação por meio de simulação computacional, que modela um fenômeno natural sem o uso de animais ou matrizes biológicas.
“Além disso, pretendemos que o InSPIRe Lab auxilie no processo de gestão de conhecimento da empresa, formando bases de dados proprietárias, atualizáveis, que gerem insights sobre novos produtos farmacêuticos, necessidades não-atendidas e tendências de mercado.”
Para falar sobre o InSPIRe e sobre outros projetos inovadores da empresa, Cristiano conversou com Future Health:
Quero entender um pouco sobre os bastidores da criação do InSPIRe Lab. Quando ele foi idealizado e sob quais circunstâncias?
O InSPIRe Lab foi idealizado em 2019, a partir da compreensão que as ciências de dados e a inteligência artificial têm impactado diferentes áreas das empresas, mas principalmente com um enfoque na área comercial.
O InSPIRe Lab é pioneiro pois trata-se de um laboratório dedicado a implementar ferramentas de machine learning e analytics para a aceleração das tomadas de decisão nas diferentes áreas dedicadas ao processo de inovação no Aché.
A inovação é um diferencial importante na indústria farmacêutica e um pilar do planejamento estratégico do Aché. Dessa maneira, fomentar a utilização de abordagens de ciências de dados para tornar o processo de inovação mais ágil e assertivo tornou-se imperativo para a empresa. A estruturação em formato de laboratório também permitirá o desenvolvimento de novos algoritmos e ferramentas computacionais, adotando uma abordagem propositiva e científica para as necessidades das áreas de inovação.
Quanto de esforço, em tempo e investimento, o Lab exigiu?
A implementação da infra-estrutura, elaboração dos projetos e contratação dos profissionais levou cerca de um ano para realização. O investimento planejado é de cerca de R$ 1 a 3 milhões nos próximos anos.
Vocês tinham algum benchmark para a criação desse laboratório?
Fizemos vários benchmarkings em indústrias de diversos segmentos, dentro e fora do Brasil. Não houve a comparação com nenhuma iniciativa em inteligência artificial/big data na indústria farmacêutica nacional, pois o InSPIRe Lab é pioneiro.
Qual é a estrutura atual dele e como os profissionais trabalham de forma integrada?
O laboratório trabalha integrado aos demais laboratórios do Aché e áreas. Iniciamos as operações em outubro com três pessoas e nossa meta até o próximo ano é ter mais colaboradores trabalhando exclusivamente no laboratório. Os profissionais que serão integrados terão perfil diverso, atuando em diferentes fases do processo para análise de dados, incluindo engenharia de dados, processamento, visualização e machine learning.
Quais os diferenciais competitivos que o Lab proporciona para o Aché?
O objetivo é gerar novos insights sobre usos terapêuticos de produtos naturais, planejar novas moléculas derivadas e/ou inspiradas por estes, predizer suas propriedades biofarmacêuticas, além de auxiliar o processo de aplicação de tecnologias farmacêuticas inovadoras a moléculas naturais e sintéticas.
Além disso, pretende-se que o InSPIRe Lab auxilie no processo de gestão de conhecimento da empresa, formando bases de dados proprietárias, atualizáveis.
Essas bases devem gerar insights sobre novos produtos farmacêuticas, necessidades não-atendidas e tendências de mercado.
Você pode me dar um exemplo de algum projeto no qual o Lab esteja envolvido agora?
O laboratório está estruturando um banco de dados que integra diferentes informações sobre a eficácia e toxicidade de produtos naturais.
Estamos capturando diversas informações que hoje estão desestruturadas em diferentes fontes.
São, por exemplo, informações de etnofarmacologia – o conhecimento tradicional sobre atividades farmacológicas de plantas medicinais –, dados in vitro e in vivo de produtos naturais, associações entre estes e ações terapêuticas etc. O grande objetivo deste banco de dados é auxiliar na ideação de novos projetos para a plataforma Bioprospera.
A Bioprospera é a espinha dorsal do programa de inovação do Aché. Como está seu desenvolvimento e quais seus objetivos?
A plataforma Bioprospera é uma das principais plataformas de inovação do Aché e tem como objetivo a descoberta e o desenvolvimento de medicamentos inovadores a partir de fontes naturais, em especial da biodiversidade brasileira, que é a maior e mais diversa do mundo.
A plataforma é estruturada para ser sustentável no sentido amplo do termo, seguindo princípios ESG – de environmental, social e corporate governance.
Isso para entregar não apenas tratamentos e resultados financeiros, mas também repartir benefícios que promovam conservação ambiental e desenvolvimento social. Ela é baseada em duas abordagens para descobrir moléculas e extratos naturais ativos: etnofarmacologia e bioprospecção.
Utilizando rigor científico, a etnofarmacologia desvenda os efeitos farmacológicos e toxicológicos descritos para plantas medicinais por meio da aplicação de técnicas bioanalíticas sistemáticas.
Já a segunda, bioprospecção, começa com expedições e coletas de amostras de diferentes biomas. Aspectos como conformidade regulatória, rastreabilidade, processamento, reprodutibilidade e controle de qualidade são muito importantes, mas os recentes avanços na instrumentação analítica, juntamente com a crescente sofisticação de bioensaios, foram o principal fator para o renascimento dessa abordagem.
Pelo menos dois cases da Bioprospera já têm sucesso: o anti-inflamatório tópico com óleo essencial de Cordia verbenacea e uma terapia experimental oral para tratamento do vitiligo, em desenvolvimento clínico. Qual a importância dessas novidades para o mercado nacional – e também para o global?
A plataforma Bioprospera já entregou um case de sucesso. Lançado em 2004, Acheflan, um medicamento anti-inflamatório tópico contendo o óleo essencial de Cordia verbenacea, foi o primeiro produto farmacêutico inovador 100% brasileiro, totalmente desenvolvido no Brasil.
Acheflan, líder de mercado em sua categoria, é exportado atualmente para 20 países.
Com base no legado deste produto, a plataforma Bioprospera produziu o que pode vir a ser outro case de sucesso: uma terapia experimental oral, contendo um extrato vegetal inovador, para tratamento do vitiligo, que acaba de obter aprovação inédita do FDA para iniciar estudo clínico de fase 2 em pacientes nos Estados Unidos. Esses são exemplos de como informações secundárias de conhecimento sociocultural sobre plantas medicinais podem ser transformadas em produtos inovadores, patenteados em nível global, que têm o potencial de impactar positivamente a vida de milhões de pacientes.
São também exemplos de como a maior biodiversidade do mundo pode posicionar o Brasil como um player global de P&D de novos medicamentos.
Além dos recursos naturais, o ecossistema do país conta com know-how científico e legislação avançada – e com o Aché, um laboratório farmacêutico brasileiro que vem assumindo um forte compromisso com a inovação ao longo dos anos.
Como um projeto da Bioprospera entra no pipeline de Inovação Radical do Aché? Quais caminhos ele percorre internamente?
Para um projeto da plataforma entrar no pipeline de Inovação Radical do Aché, candidatos a projeto passam primeiro por um processo de avaliação de oportunidades que engloba uma análise ampla de diversos critérios relevantes ao negócio, nomeada Matriz de Priorização de Projetos. Essa é uma ferramenta desenvolvida internamente que tem como objetivo apoiar a tomada de decisão relacionada à entrada de projetos.
Em geral, os critérios normalmente consideram o potencial avanço científico e tecnológico, os potenciais impactos econômicos e comerciais, alinhamento estratégico, além de questões relacionadas à atividade inventiva/propriedade intelectual e impacto ambiental.
Os diferentes critérios assumem pesos diferentes para lidar com objetivos, tempos e riscos diferentes, criando uma espécie de ranking de projetos. Os projetos mais bem pontuados são levados a fóruns de discussão mais amplos com áreas de interface à Inovação Radical, de maneira que seja criada uma proposta de valor com planejamento de atividades e custos através do processo de I2B [Idea to Book] do Aché. O último fórum, compreendido pela alta liderança do Aché, aprova a entrada do projeto no pipeline de Inovação Radical.
Que importância estratégica tem a inovação no Aché? O laboratório fornece dados como investimentos em inovação e receita esperada disso?
O Aché Laboratórios Farmacêuticos é um dos líderes no mercado farmacêutico brasileiro, com receita líquida de R$ 3,5 bilhões e mais de 300 produtos em seu portfólio.
Para conquistar diferenciação no mercado e internacionalizar a empresa, o Aché vem ampliando seus investimentos em inovação ao longo dos anos.
A saber: infraestrutura, estrutura organizacional, cultura, processos e tecnologias – o que contribuiu para o aumento do nível de inovação da empresa e de seu pipeline. O Aché foi reconhecido como a indústria farmacêutica mais inovadora do Brasil nos últimos seis anos e está entre as empresas mais inovadoras do país, quando todos os setores da indústria são considerados, segundo o ranking Valor Inovação. Destinamos 8% do Ebitda da empresa para inovação anualmente.