• Como uma consulta médica presencial de 7 minutos fez nascer a healthtech OnDoctor

    De olho em quem não tem plano privado e nos brasileiros com pouco acesso a médicos especializados, a plataforma de telemedicina criada por Alexandre Gattaz pretende democratizar o acesso à saúde no país
    Jose Renato Junior | 24 nov 2020

    Semanas – ou até meses – para agendar uma consulta. Tempo de deslocamento. Necessidade de desmarcar compromissos, remarcar reuniões. Transporte (seja público ou privado) e trânsito. Espera no consultório. Quantos dias, semanas ou até mesmo meses fazem parte do planejamento de uma simples consulta médica? 

    Alexandre Gattaz começou a prestar atenção de fato a quanto isso não fazia muito sentido em agosto de 2019. Morando, à época, na Holanda, tirou férias para voltar ao Brasil e aproveitou a viagem à terra natal para tratar uma doença crônica. Marcou, então, uma visita a um médico. 

    A espera para ser atendido, uma vez no local, passou das duas horas – mas o papo com o especialista durou cerca de sete minutos. Pedidos simples de exames, continuidade dos medicamentos e R$ 300 pela visita.

    “Com a experiência de ter sido atendido remotamente na Holanda, procurei um amigo de longa data que é médico para discutir sobre o assunto”, conta. 

    O amigo, Pedro Pássaro, que já estava bastante envolvido nas discussões sobre os avanços da telemedicina no Brasil, se interessou pela possibilidade de fazer a diferença neste mercado que parecia promissor. 

    Era a primeira fagulha para o nascimento da OnDoctor, startup que tem como objetivo democratizar e facilitar o acesso à saúde no Brasil, independentemente de localização ou classe social. O foco são pessoas que não são cobertas pelos planos de saúde privados ou que têm pouco acesso a médicos especializados devido à distribuição desigual de profissionais pelo país. 

    Seu funcionamento é simples: o paciente baixa um aplicativo, escolhe o profissional que deseja consultar (ou o horário mais conveniente) e realiza o pagamento da consulta. No horário agendado, basta entrar no “consultório virtual” para ser atendido. 

    Para o profissional de medicina, a plataforma funciona como um consultório virtual, oferecendo as funcionalidades de organizar e disponibilizar a agenda para atendimento, consultório virtual para a realização da consulta por videoconferência (com prontuário, prescrição de medicamentos, exames e atestados) e gestão financeira. 

    “Nosso objetivo é retirar toda a burocracia e entraves administrativos para que o profissional consiga focar no que é mais importante para ele e para o paciente: a consulta”, conta Alexandre. 

    Hoje, a OnDoctor tem profissionais credenciados na plataforma nas especialidades de clínica geral, pediatria, psiquiatria e psicologia.

    Os próximos profissionais a estarem disponíveis na plataforma são ginecologistas, nutricionistas, doulas, consultoras de amamentação e consultoras de sono do bebê. Os preços praticados variam de R$ 75 por consulta com um clínico geral a R$ 200 com um psiquiatra. 

    NASCER NA PANDEMIA É UM PARTO DIFÍCIL

    Dez meses se passaram entre a conversa de Alexandre com Pedro até o lançamento da OnDoctor – tempo gasto, em sua maioria, para mapear o setor da saúde no país e identificar formas de utilizar a tecnologia para preencher esse gap, de forma conveniente e acessível. 

    “Após definido o posicionamento estratégico, tivemos que vencer a burocracia para ter a empresa efetivamente aberta na Junta Comercial, visto que o registro se deu no meio da pandemia e muitos do órgãos estavam fechados”, pontua Alexandre. 

    “Somado a isso, todos os sócios da OnDoctor residem em países diferentes – Brasil, Estados Unidos e Espanha –, o que adicionou ainda mais complexidade no processo administrativo.” 

    O registro final foi realizado em maio deste ano e, a partir daí, o resto do time pode ser montado: três desenvolvedores, três profissionais de marketing e um assessor jurídico especializado em startups healthtech – todos trabalhando de forma 100% remota. 

    Todo o investimento na startup foi realizado pelos sócios – em valores não revelados para a reportagem. Além de Alexandre (CEO), que é formado em Engenharia da Computação e tem um MBA pelo Insead (França e Singapura) e Pedro (COO), médico oftalmologista com nove anos de experiência clínica, a OnDoctor também foi fundada por Eduardo Spina (CTO), engenheiro da computação também com MBA pelo Insead.

    ATENDIMENTOS GRATUITOS PARA A LINHA DE FRENTE

    Durante a pandemia causada pelo novo coronavírus, a OnDoctor ofereceu por volta de 200 atendimentos gratuitos para pacientes com sintomas ou dúvidas relacionadas à Covid-19. 

    “Focamos nossos esforços em oferecer esses atendimentos em regiões com menor acesso a profissionais de saúde, como em algumas cidades menores, longe das capitais, do Norte e Nordeste do Brasil”, conta Alexandre. 

    “Um caso bastante marcante para nós foi o relato de uma paciente que estava acamada e não conseguia acesso a um médico em sua cidade. Sua irmã entrou em contato conosco e pediu um atendimento para ela, que foi feito imediatamente com um dos nossos médicos de plantão”, explica. 

    A paciente tinha alguns sintomas da doença provocada pelo Sars-Cov-2, estava bastante preocupada e precisava de apoio profissional para avaliar o seu caso. Após o atendimento com a OnDoctor, ela se mostrou muito mais tranquila pelo fato de ter sido escutada e ter suas dúvidas esclarecidas. 

    “Esse momento foi crucial em nossa jornada, pois confirmou que um atendimento humanizado pode ser realizado com facilidade através da tecnologia, o que nos deu ainda mais força para continuar em nossa jornada”, diz o CEO.

    A startup também cuidou de quem cuida: disponibilizou 100 consultas gratuitas com psicólogos para quem está na linha de frente – profissionais de segurança pública e saúde, motoristas e entregadores de bens essenciais –, em outubro deste ano. 

    “Conseguimos auxiliar muitas pessoas com a iniciativa, mas nosso maior desafio tem sido reverter os preconceitos que as pessoas ainda têm em buscar ajuda com um profissional nos momentos difíceis”, afirma Alexandre. 

    “Diante disso, estamos colocando esforços para disseminar informação e conhecimento, para que as pessoas se sintam mais confortáveis para quando precisarem de um apoio profissional”, continua. 

    “Pretendemos desenvolver iniciativas semelhantes no futuro também em outras áreas de saúde, como prevenção a doenças cardíacas, controle da obesidade e prevenção ao câncer de pele.”

    No campo social, os planos da OnDoctor também se estendem a ONGS: a healthtech está construindo parcerias com organizações não-governamentais que possuem forte atuação em localidades menos privilegiadas. 

    “Utilizando a penetração e a infraestrutura proporcionada por essas entidades, pretendemos levar consultas subsidiadas [pelo setor privado ou pelos próprios profissionais de saúde] para essa população carente, maximizando o impacto social que a nossa tecnologia pode gerar”, pontua. 

    PARCERIAS COM O ECOSSISTEMA DE SAÚDE NA MIRA

    Cinquenta mil consultas em 2021 e aproximadamente R$ 6 milhões de faturamento: em um mercado que passou a receber muito investimento e os holofotes do mundo inteiro, os planos da OnDoctor são ousados. 

    Para chegar lá, a diretoria da startup pretende estreitar algumas parcerias estratégicas com redes de laboratórios, farmácias, hospitais e clínicas regionais. 

    “Queremos integrar o paciente no ecossistema de saúde brasileiro, empoderando nossos usuários com acesso à informação e aos seus dados de saúde”, explica Alexandre. 

    “Dessa forma, nossos usuários poderão ter uma solução completa, desde a primeira consulta até a gestão de seus medicamentos e como eles impactam em sua saúde ao longo do tempo.”

    Em paralelo, um plano que pode mudar o jogo para a OnDoctor: disponibilizar a plataforma para que profissionais de saúde possam consolidar a gestão de todos os seus atendimentos (seja presencial ou por telemedicina) em uma só ferramenta que ofereça todas as funcionalidades necessárias. 

    Se tudo isso der certo, a OnDoctor se fortalecerá em um mercado que visa, cada vez mais, evitar que as pessoas gastem tempo, deslocamento e até mesmo dinheiro desnecessário para fazer algo que pode ser concluído com êxito de dentro de seus próprios lares.

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